Português
Os 10 anos que tenho enquanto treinador, foram todos passados em contexto de formação, das mais diversas categorias dos 5 aos 18 anos.
A primeira reflexão que vos trago prende-se com um facto de que como qualquer miúdo que inicia a sua prática sonha vir a ser um Ronaldo ou um Messi, nós também alimentamos o Sonho de tornar esta paixão que temos pelo futebol, a nossa profissão.
No entanto, a audácia deste sonho que nos faz ter a ambição de concretizar objectivos a curto/médio prazo nunca poderá ser confundido com a valorização da vitória como único meio de sucesso.
"O que é determinante e pode condicionar o processo de formação dos jovens é a importância e significado que se dá ao resultado. Nesta lógica não se pode associar única e exclusivamente a vitória ao sucesso e a derrota ao fracasso" (Bruno Lage, 2017).
Temos nós treinadores, a cultura do resultado acima da formação do Jogador?
A resposta surgirá sempre através de outra questão: “Em que ordem estou colocar os factores prazer, desenvolvimento e ganhar?”
Ganhar faz e fará sempre parte da essência do Jogo, e é importante que os nossos jovens atletas sejam educados nesse sentido, na procura de uma constante evolução e superação de capacidades e atitudes que lhes permitam estar mais perto do sucesso, individual e coletivo.
Mas medir o sucesso, apenas e só pelo resultado, será sempre uma perspectiva redutora e egoísta, de olharmos primeiro para Nós (Treinadores) e só depois para o Jogador.
“Óbvio que ganhar títulos é importante, mas não é tudo. O que me interessa é que, a certa altura, os meus jogadores me digam: “Treinador, você ajudou-nos e tornou-nos melhores jogadores. Aprendemos muito consigo.” (Guardiola, 2013)
Ajudar, ensinar terá que ser forçosamente o caminho e o objectivo de um treinador de formação, olhar para o jogador como o “mais importante”, acrescentar com o propósito de os desafiar a reflectir e de dar ferramentas que lhes permitam agir e decidir perante o contexto do jogo e da vida.
Partindo do pressuposto que todos aceitamos a formação do atleta como a figura central no nosso papel de treinador, passamos a refletir sobre a forma como o fazemos? Como contribuímos para a sua evolução? O que ajuda os jogadores a serem mais eficazes nas suas acções?
“O treino deve preparar o jogador para resolver por si próprio os problemas decorrentes do seu envolvimento com o jogo, fazendo um sistemático apelo às suas capacidades decisionais” (Araújo 2015)
Vezes sem conta repetimos que o treino é o reflexo do jogo e que o desempenho de um jogador em competição é consequência do trabalho realizado no treino.
Não será tão linear assim, até porque não jogamos sozinhos, mas a verdade é que o ensino do jogo ocorre principalmente do processo de treino, assumindo este um papel capital na evolução individual de cada jogador.
A prática deve ser específica, o treino deve ir de encontro ao jogo, os atletas precisam de ser constantemente estimulados para situações reais de jogo, mesmo que de forma simplificada, condicionada ou reduzida, é através da repetição de situações que mantenham a orientação e funcionalidade do jogo, que os nossos jogadores vão ter maior capacidade e autonomia para tomarem decisões acertadas.
Quando a maioria de nós treina 3 vezes por semana, muitos com menos de uma hora e meia por unidade de treino e quase sempre em ½ campo, fará sentido perdermos 50% do Tempo Potencial de Aprendizagem que temos, em exercícios com situações analíticas que em nada contribuem para aprendizagem e conhecimento do Jogo?
Padronizar um ataque, mecanizar um conjunto de passes, robotizar movimentos, parece-me uma abordagem de ensino questionável, num jogo que a cada dia que passa, se torna mais organizado, mais tático, mais estratégico e que obriga os jogadores a uma decisão e execução cada vez mais rápida.
Nesta evolução do jogo, já não basta termos na equipa os melhores atletas do ponto de vista técnico, os mais rápidos, fortes ou resistentes, precisamos de jogadores inteligentes que consigam otimizar a sua tomada de decisão (agir de forma certa e no momento certo) em função da informação do que o jogo oferece, a posição da bola, dos colegas, dos adversários.
"Um jogo de futebol, é acima de tudo um jogo de decisões", por isso, um dos aspectos fundamentais na concretização do sucesso das aprendizagens, é o conhecimento do Treinador sobre o “quê”, “quando” e “como” transmitir os conhecimentos aos seus jogadores. Uma metodologia de ensino/treino que vise potenciar o conceito da tomada de decisão, que aponte caminhos e ofereça ferramentas serão a chave para termos jovens futebolistas capazes de escolher no contexto competitivo e em cada momento, a melhor resposta possível.
A Força do Feedback
Para o bem e para o mal, o feedback é o instrumento mais útil que o treinador têm
para estimular ou condicionar a tomada de decisão do atleta.
Num exercício de introspecção, quantos de Nós em Treino ou em Jogo não nos revemos a fazer o “relato” do mesmo? “Têm espaço, acelera!” “Joga por dentro, o Manel está sozinho”,“vamos João, chuta”! são formas de comunicar muitas vezes utilizadas com o intuito de incentivar a concretização da acção.
Não o devemos fazer? Sim podemos fazê-lo mas com a consciência que em excesso estamos a condicionar a decisão do atleta e a inibir a sua autonomia e criatividade.
Mas Mister… “A minha equipa, reage melhor se eu tiver permanentemente a dar indicações para dentro do campo, se eu me calar eles vão desligar!”
Muito bem… E já pensaram na dependência que podem estar a criar? Que estamos a formatar comportamentos? E a longo prazo? Quando mudarem de treinador como vai ser ser?
Se acreditamos que o ensino do Jogo está no Treino, então devemos adoptar estratégias que permitam aos atletas se expressarem durante o treino, colocar questões, promover um feedback interrogativo, "Mister, ganhei a linha de fundo, vou cruzar?" Vais cruzar porque? Vais cruzar para quem?, estimular pensamento que o atleta tem sobre aquela acção e decisão e o desenvolvimento cognitivo sobre o jogo.
Uma forma de confrontar o atleta com os mais variados problemas, não apresentando uma solução para o imediato, mas sim as possibilidades de resolução.
Em suma, ser Treinador na Formação, é formar para ganhar e não formatar para ganhar, é olhar para o treino como o veículo para a evolução dos nossos jovens, com tempo e paciência de sermos tolerantes ao erro, e numa condução que nos terá que levar ao equilíbrio permanente entre a aprendizagem modelada dos princípios de jogo e a liberdade da decisão.
Porque é na liberdade, que encontramos a irreverência, a criatividade e a magia que torna este jogo tão imprevisível e apaixonante!
"Um jogador deve ser livre de agir, sem agir livremente"!
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English
My 10 years as a coach were all spent in the context of training, from the most diverse categories from 5 to 18 years.
The first reflection I bring to you is that like any kid who starts his practice dreams of becoming a Ronaldo or Messi, we also nurture the dream of making this passion we have for football, our profession.
However, the audacity of this dream which gives us the ambition to achieve short/medium-term objectives can never be confused with the appreciation of victory as the only means of success.
"What is decisive and can influence the process of formation of young people is the importance and significance that is given to the result. In this logic, one cannot uniquely and exclusively associate the victory to success and defeat to failure" (Bruno Lage, 2017).
Do we have coaches, the resulting culture above the Player’s formation?
The answer will always come through another question: "In what order am I putting the factors of pleasure, development and winning?"
Winning is and always will be part of the essence of the Game, and it is important that our young athletes are educated in this sense, in the search for a constant evolution and overcoming of abilities and attitudes that allow them to be closer to success, individual and collective.
But measuring success, just and only by the result, will always be a reductive and selfish perspective, of looking first at Us (Coaches) and only then at the Player.
"Winning titles is important, but that’s not all. What interests me is that at some point, my players tell me, "Coach, you helped us and made us better players. We learn a lot from you." (Guardiola, 2013)
Help, teach will have to be forcibly the path and purpose of a training coach, look at the player as the "most important", to add to challenge them to reflect and to give them tools to act and decide before the context of the game and life.
Assuming that we all accept the training of the athlete as the central figure in our role of coach, do we reflect on how we do it? How do we contribute to their evolution? What helps players to be more effective in their actions?
"The workout should prepare the player to solve for himself the problems arising from his involvement with the game, making a systematic appeal to his decision-making abilities" (Araújo 2015)
Time and again we repeat that the workout is the reflection of the game and that the performance of a competing player is a consequence of the work done in the workout.
It will not be so linear, even because we do not play alone, but the truth is that the teaching of the game occurs mainly from the training process, assuming this a capital role in the individual evolution of each player.
The practice must be specific, the training must go against the game, the athletes need to be constantly stimulated for real situations of play, even in a simplified, conditioned or reduced way, it is through the repetition of situations that maintain the orientation and functionality of the game, that our players will have greater capacity and autonomy to make the right decisions.
When most of us train 3 times a week, many less than an hour and a half per training unit and almost always in ½ field, it will make sense to lose 50% of the Potential Learning Time we have, in exercises with analytical situations that contribute nothing to learning and knowledge of the Game?
Standardizing an attack, mechanizing a set of passes, robotizing movements, seems to be a questionable teaching approach, in a game that every day that passes becomes more organized, more tactical, more strategic and forcing players to make an ever faster decision and execution.
In this evolution of the game, it is no longer enough to have in the team the best athletes from a technical point of view, the fastest, the strongest of the strongest, we need smart players who can optimize their decision making (act right and at the right time) depending on the information of what the game offers, the position of the ball, the colleagues, the opponents.
"A football game is above all a game of decisions", therefore, one of the fundamental aspects in the achievement of the learning success, is the trainer’s knowledge about the "what", "when" and "how" to transmit the knowledge to its players.
A teaching/training methodology that aims to leverage the concept of decision making, which points out paths and offers tools will be the key to having young footballers able to choose in the competitive context and at every moment, the best possible response.
The Power of Feedback
For better or for worse, feedback is the most useful instrument that the coach has
to stimulate or condition the decision of the athlete.
In an exercise of introspection, how many of us in Training or the Game do not see ourselves doing the "story" of it? "They have space, accelerate!", "Play inside, Manel is alone","come on John, kick"! are examples of feedback that is often used to encourage action.
Shouldn’t we do it? Yes, we can do it but with the awareness that in excess we are conditioning the decision of the athlete and inhibit his autonomy and creativity.
But Mister… "My team reacts better if I have permanently given directions into the field, if I shut up they will shut down!"
And have you thought about the dependency you might be creating? What are we shaping behaviours? And in the long run? When they change coaching, what’s it gonna be like?
If we believe that the teaching of the game is in Training, then we must adopt strategies that allow athletes to express themselves during training, ask questions, promote interrogative feedback, "Mister, I won the bottom line, will I cross?" Why are you crossing over? Who are you crossing over to? , stimulate the thought that the athlete has about that action and decision and the cognitive development about the game.
A way to confront the athlete with the most varied problems, not presenting a solution for the immediate, but rather the possibilities of resolution.
In short, to be Coach in Training, is to form to win and not to format to win, is to look to training as the vehicle for the evolution of our young people, with time and patience to be tolerant of error, and in driving that must lead to a permanent balance between the modelled learning of the principles of play and the freedom of decision.
Because it is in the freedom that we find irreverence, creativity and magic that makes this game so unpredictable and exciting!
"A player must be free to act, without acting freely"!
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